Meu pai sempre apreciou uma cervejinha gelada com os amigos. Nada fora do comum.
Com o surgimento da doença, há alguns anos atrás, não sei por qual motivo (imagino que poderia ser uma fuga do subconsciente), começou a beber diariamente. O que tivesse a seu alcance. Bebia cerveja, whisky, caipirinha, qualquer coisa.
Era triste vê-lo daquele jeito, mas tanto eu quanto minha mãe e irmãos, não sabíamos lidar com o novo temperamento e personalidade do meu pai. Ainda.
No ano retrasado, paramos de comprar qualquer tipo de bebida alcoólica e esvaziamos a dispensa. Mesmo assim, meu pai saía para comprar cerveja, ou saía para beber em lugares próximos de casa, a pé mesmo(ele já não estava mais podendo dirigir - vou falar sobre isso em outro post). Ele aproveitava quando ninguém estava olhando e saía de fininho. Como o celular era algo inseparável naquela época, eu ligava para ele e ia buscá-lo, bêbado.
Os médicos recomendavam que meu pai não ingerisse álcool, pois atrapalharia o efeito dos remédios. Moderadamente, até poderia beber. Mas o que seria moderado, se a partir de um certo ponto, não era mais possível ter o controle? Ele xingava o médico de "idiota", "burro", etc, e afirmava que tinha total controle do corpo e podia beber o quanto quisesse.
Em festas em família, os tios e primos sempre ofereciam a maldita cervejinha. E quem disse que meu pai recusava? Agradecia e fazia até brinde. Era muito desagradável ter que pedir a todos que não oferecessem bebidas alcoolicas ou, pior ainda, pedir a todos que não bebessem perto dele.
É difícil para pessoas saudáveis, sem doentes convivendo com elas, entender o mal que o álcool faz a uma pessoa que toma medicamentos fortíssimos. Meu pai ficava extremamente agressivo quando bebia e parecia até "possuído": arregalava os olhos e gritava com minha mãe, comigo e com meus irmãos. Teve uma época que minha mãe ficava com tanto medo do meu pai, que quase não dormia direito. Ela sentia-se apavorada, imaginando que ele pudesse matá-la enquanto ela dormia.
Com o passar do tempo, conseguimos controlar as saídas do meu pai, ficando "de olho" em tempo integral. Para tentar disfarçar a vontade de beber cerveja, tive uma idéia incrível: enchemos a geladeira de refrigerantes em latinha. O barulho ao abrir uma latinha de Coca é igual ao barulho ao abrir uma latinha de cerveja ("tsssssiii"). Como meu pai sempre foi fã de Coca-cola, ele tomava o refrigerante e esquecia a vontade de beber cerveja.
De vez em quando, ele abria todos os armários da cozinha, à procura de cerveja, mas eu dizia que ninguém em casa bebia e ele ficava bem nervoso.
Com o passar do tempo, ele parou de procurar cerveja. Antes de sentir sede, eu já oferecia uma "coquinha geladinha" e ele aceitava, contente.
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