quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Meu pai (quase) escreveu um livro


Antes de adoecer, meu pai teve uma daquelas conversas profundas comigo em uma das vezes que fui visitá-lo. Ele trabalhava e morava em Santa Catarina, numa cidadezinha de 50 mil habitantes. 

Conversamos sobre muitas coisas, entre elas, sobre sua profissão e seu conhecimento na área. Tristemente, me confessou que gostaria muito que um de nós 3 (filhos) seguíssemos sua carreira de engenharia mecânica, mais especificamente na área de caldeiras. Lamentou-se um pouco por não ser possível transmitir todo a sua experiência para os filhos, enfatizando que era muita coisa. 

Até lembrou que eu quase entrei para a engenharia, na época do vestibular, (engenharia de alimentos na UNICAMP). Lembro-me que na época de espera pelos resultados dos vestibulares, meu pai me incentivava estudar engenharia e eu, achava que nutrição era mais a minha cara.

Meu irmão até começou a fazer engenharia florestal, mas depois de 2 anos resolveu assumir seu gosto pela arte e foi fazer Cinema. Acho que ele será um sucesso, pois é muito talentoso. 

Sugeri, então, que ele escrevesse um livro. Na hora ele ficou meio na dúvida, mas pouco depois, já se animou. Disse que durante sua faculdade e no início do trabalho foi muito difícil adquirir informações específicas sobre caldeiras e que não havia livros didáticos para estudar e se aprimorar nesta área. Foi preciso aprender tudo sozinho, com a prática.

Começou a planejar alguns passos, como comunicar-se com outros engenheiros para que pudessem colaborar em alguns capítulos. Na época, meu namorado era apenas meu amigo (e que amigo!) e costumávamos nos comunicar por e-mail ou telefone. Ele estudava engenharia mecânica na UNICAMP e meu pai pediu alguns contatos de professores da área para ele. 

A partir de então, começou a escrever a noite ou aos finais de semana. A estrutura ficou completa, com sumário e outros ítens. Mas o conteúdo, infelizmente, não deu tempo de terminar. Era muita informação e o volume do livro prometia ser enorme. 

No início da doença, o livro foi abandonado. Meu pai até tentava começar a escrever, mas dizia que não estava inspirado e que dava preguiça. Meu pai nunca teve preguiça na vida antes de ficar doente! Foi estranho.

No ano passado ele ficou um tempão procurando o arquivo com o livro dele no computador, mas ele não se lembrava onde tinha salvo. Ajudei a encontrar e salvei no Desktop. E pedi para ele me mandar por e-mail, caso "perdesse" novamente. 

Quando li os agradecimentos, tive uma surpresa e algumas lágrimas escorreram pelo meu rosto de emoção, mesmo por ter sido citada em apenas 1 linha:

2. Introdução
(...) Agora, depois de muita hesitação e passados muitos anos, resolvi, finalmente, escrever um livro técnico sobre caldeiras, pois disponho de tempo para isso e, segundo minha filha Mônica, que não quis seguir a carreira do pai, só falta esta atividade para completar minhas tarefas importantes nesta vida.
Já vinha construindo a idéia sobre a estrutura e conteúdo, ao longo dos anos, e utilizei todo o material que venho acumulando nestes 30 anos de trabalho com caldeiras em empresas como CBC-Mitsubishi (Brasil / Japão), Combustion Engineering ( USA ), Foster-Wheeler ( USA, Brasil ), Thyssen-Henschel ( Alemanha ), Kawasaki-Dedini ( Brasil ) e, mais recentemente, Alstom, antiga C-E ( USA ), Aker-Kvaerner ( Finlândia ) e Andritz ( Finlândia / USA ), além das experiências práticas na H. Bremer ( Santa Catarina, Brasil ), e na Biochamm ( Santa Catarina, Brasil ), onde, através de um Cliente, consegui também obter algumas informações interessantes sobre as caldeiras da EVT-Sulzer-GEC-Alsthom ( Alemanha ) para elevadíssimas capacidades, pressões e temperaturas utilizadas principalmente em grandes centrais termoelétricas a carvão pelo mundo afora.
 3. Agradecimentos
Agradeço à minha filha Mônica, que me incentivou a executar e concluir este livro."

4 comentários:

  1. Olá Monica...li cuidadosamente todos os seus posts e gostei muto da sua narrativa das dificuldades diárias que vc enfrenta e que com muito bom humor e inteligencia consegue supera-las ....
    O Dr. Vitor é meu amigo e colega de turma , não poderia estar com melhor profissional da área.
    Com certeza , seu blog deveria ser lido por todas as pessoas que passaram ou passam por algum problema semelhante , pois serve de inspiração e exemplo

    Gambarê

    Estou à disposição para qualquer coisa que precisar...

    Dr. Adalberto Uenohara

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    1. Olá, Dr. Adalberto, muito obrigada por ler todos os posts e por comentar, fiquei super contente!
      Se quiser, pode compartilhar o blog com as pessoas que se interessarem hehehe!
      Grande abraço e, novamente, obrigada!

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  2. Olá, finalmente encontro na internet o seu blog. Inúmeras vezes fiquei horas a fio a procurar algo mais humano nesta virtualidade técnica. Convivo com uma pessoa que está passando por isso. Sei que não é nada fácil, mas pelas suas narrativas, só posso te dizer que teu pai está muito bem. A pessoa que conheço já não se comunica, não fala, foi muito rápido: 2 anos e pouco, uma vela se apagando. é triste, é difícil, exige cuidado, amor, paciência e esperança. Obrigada por compartilhar.

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    1. Olá, obrigada por comentar! Gostaria que todos os (poucos) leitores escrevessem alguma coisa, assim como você, pra saber o que pensam sobre as minhas histórias.
      :)

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